Começo essa crítica dizendo que Emilia Pérez não é um trabalho ruim, mas também não deve levar o Oscar (pelo menos, de melhor filme).
A questão sobre o sucesso do filme na premiação, com 13 indicações, vai muito além das falas polêmicas de sua protagonistas, da incapacidade do diretor de aceitar críticas, do elenco em sua maioria americano ou da visão estereotipada do povo mexicano.
A premissa do filme é sim muito boa. A trama gira em torno de Juan “Manitas” Del Monte (Karla Sofía Gascón), um temido chefe de cartel mexicano que decide abandonar sua vida criminosa para finalmente viver como a mulher que sempre sentiu ser. Para realizar essa transição, ele busca a ajuda de Rita Mora Castro (Zoe Saldaña), uma advogada brilhante, porém subestimada, que trabalha em uma firma mais preocupada em encobrir crimes do que em servir à justiça. Rita, cansada de sua rotina desmotivadora, vê nessa proposta uma oportunidade de mudança.
Após uma série de consultas médicas e preparações, Manitas forja sua própria morte e ressurge como Emilia Pérez. Mas a personagem não consegue ficar longe de sua família e retorna à Cidade do México, onde tem que refletir sobre seus passado e as consequências de suas escolhas. Emilia decide usar suas conexões no mundo do crime para fundar uma organização sem fins lucrativos dedicada a identificar corpos de vítimas de cartéis, buscando redenção por meio de boas ações.
Polêmicas nos batidores de Emilia Pérez
A história é bem interessante, não? É uma pena que durante a exibição o público tenha as suas expectativas consideravelmente diminuídas com as escolhas adotadas. Primeiro, optou-se por criar um drama com pitadas musicais, assim como La La Land. Só que diferente de sua inspiração, Emilia Pérez não desenvolve com maestria as suas canções e nem as suas performances, deixando as “apresentações” desconexas com a trama. Diferente, por exemplo, de Coringa 2 que criou cenas musicais satisfatórias, no entanto pecou na jornada do personagem principal.
Outro problema que salta aos olhos é a caracterização do povo mexicano. Acredito que nenhuma nação (e incluo nós brasileiros aqui) gostaria de ver a sua cultura, o seu país mal representado. E esse é o caso. Afinal, o diretor Jacques Audiard não pisou em solo mexicano para realizar pesquisas ou filmagens para o filme, definiu os mexicanos como um povo em sua maioria carente (atenuando bem as suas palavras) e disse que não pode, por conta de seu orçamento limitado, escalar um elenco espanhol para o filme. O resultado: clichês, esteriótipos irritantes e uma atuação pra lá de sofrível de Selena Gomez.
Como se não bastasse tantas polêmicas, Karla Sofía Gascón foi para frente das câmeras falar que a equipe Fernanda Torres estava liderando uma campanha de ódio contra Emilia Pérez, em uma total dissonância com a realidade. Suas falas incomodaram – e muito – os brasileiros, que há anos não se sentiam tão animados com cinema nacional. Mas a reviravolta neste história não veio do nosso país. A jornalista canadense Sarah Hagi, e uma mulher muçulmana, foi quem descobriu os tweets racistas da atriz e os revelou ao mundo. Como um efeito colateral difícil de engolir, a Netflix, que produz o filme, resolveu tirar Karla de toda a campanha promocional envolvendo Emilia Pérez – inclusive, se ela quiser participar da cerimônia do Oscar terá que pagar as despesas do próprio bolso.
Quanto mais Ainda Estou Aqui ganha terreno nos EUA, mais as chances de Emilia Pérez para ganhar tanto nas categorias de Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Filme diminuem. Ainda bem que Zoe Saldaña salva o projeto de um completo fracasso. A sua atuação é sim digna de Oscar – e me arrisco dize que seja, talvez, um dos melhores trabalhos de sua carreira. Assim como no Globo de Ouro, a atriz é a favorita para levar a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante para casa e quem sabe salvar o filme de um total cancelamento.
